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Maestro da batuta de ouro

Músico contribuiu para o desenvolvimento do ensino de música em Araras e para formação da Corporação Musical Maestro Francisco Paulo Russo, atuante até os dias de hoje

Baluarte e propagador da arte em Araras, o Maestro Franscisco Paulo Russo nasceu em Nápoles, na Itália em 21 de agosto de 1882. Aprendeu música em Nápoles e em Pizo, na Calábria, com o nobre maestro Jacob Percy.
Em 1895, aos treze anos, veio pra o Brasil e ainda muito jovem se estabeleceu em Araras. Além de trazer seu conhecimento musical também contribuiu com sua força de trabalho, e começou a trabalhar como barbeiro, abrindo o Salão “Brasil”, localizado na Praça Oito de Abril. Desbravador da música e de personalidade artística multifacetada ministrava aulas de piano, teatro, e dramaturgia. Teve trabalho intenso com teatro em Araras criando o grupo de teatro amador “Grupo Dramático Operário” e a “Sociedade Recreativa de Danças”.
Em dois de setembro de 1926, criou o curso de piano em Araras, e foi responsável também pela fundação da corporação musical “Lira Infantil”. Entrou na regência da “Corporação Musical Carlos Gomes”, após a morte do antigo maestro Franscisco Puzone. O maestro nessa época foi pioneiro na região fazendo com que sua orquestra tocasse nos cinemas musicados (nesse período os filmes eram mudos e a trilha sonora era executada pela orquestra que tocava ao vivo).
Fundou também a Corporação Musical “Pedro Mascagni” e reestruturou a “Banda Carlos Gomes”, implantando o uso de uniformes e aumentando seu contingente para 30 componentes.
Em 1922, o maestro trouxe para Araras a conquista do 1° lugar no Concurso de Bandas realizado na comemoração do Centenário da Independência, realizado em São Paulo. Dentre outras atividades, foi ainda presidente da “Sociedade 21 de outubro”, proprietário do jornal Tribuna do Povo.
O teatro sempre foi sua paixão e chegou a compor várias peças musicais como: “Alma Ararense”, “Hino do Ginásio do Estado de Araras”, “Tempo de Mazurca”, “Hino do Centro Cultura Ararense” e “Pensamento Religioso”, dedicado ao Papa Pio XII.
Franscisco Paulo Russo foi casado com Sra.Carmen Brigante Russo e com ela teve quatro filhos: Paulo Américo Russo, Oswaldo Russo, Arnaldo Russo, Clotilde Russo e Aldo Russo.

Homenagens ao maestro

Em agradecimento aos vários serviços prestados para Araras, o maestro foi presenteado com batuta de ébano e ouro junto com os dizeres “a preciosa lembrança de uma batuta de fino ébano guarnecida de ouro, da mocidade ararense, representa o carinho e reconhecimento do povo de Araras ao esforçado Maestro que, com sua disciplinada Corporação, colheu os maiores louros na Capital".
Fora isso, a Câmara Municipal outorgou ao maestro o nome de uma das ruas do centro da cidade.
Em 1991, com a construção do teatro estadual, o governador Orestes Quércia comunicou à família que gostaria de homenagear o maestro dando ao teatro a nomeação “Teatro Estadual Franscisco Paulo Russo”.
Marcos Aurélio Russo, neto do maestro, não chegou a conhecê-lo, porém contou que se lembra de quando foi comunicado da homenagem. “Recebemos o comunicado do próprio governador Orestes Quércia, que queria homenagear esse personagem tão importante para a história cultural de nosso município”
Marcos comentou também sobre a importância e a relevância do avô no papel de fomentador artístico de Araras. “Os imigrantes italianos que vieram na época de meu avô trouxeram para o município a força de trabalho. Creio que o maestro, além disso, foi o baluarte cultural em nosso município, trazendo consigo em sua bagagem a música, que é a arte mais singela de todas”, comentou Russo.

Breve biografia de um discípulo de Franscisco Paulo Russo

A história musical de Araras é bem rica e traz dentro de sua essência personagens que cravaram suas notas musicais nos corações e nas mentes de gerações de apreciadores da música. As bandas de coreto são tradição única e exclusiva dos municípios do interior e é marca cultural registrada. Até a pouco tempo a Corporação Franscisco Paulo Russo recebeu o título de Ponto Cultural pelo Ministério da Cultura, tamanha sua importância artística.
O maestro Franscisco Paulo Russo quando reorganizou a “Banda Carlos Gomes”, deu o ponta pé inicial ao crescimento e a exposição nacional da música realizada em Araras, trazendo de São Paulo em 1922, o 1º lugar no Concurso de Bandas na comemoração do 1° Centenário da Independência.
Inúmeros músicos passaram pela corporação e puderam conviver com o trabalho rigorosamente artístico de Franscisco Paulo Russo.
Meu avô, Antonio de Castro, foi um dos componentes que fizeram parte da banda. Procurando em seus arquivos fotos da época em que tinha o conjunto Tito e sua Banda, encontrei um diário escrito por ele, contando da experiência de entrar para a banda do maestro. Tito tocava trombone de vara e também bombardino e relata exatamente como foi seu teste para entrar na banda Carlos Gomes. No diário Tito conta como esse momento foi inesquecível: “Foi um tarde de agosto de 1938, quando contava com 15 anos de idade foi guiado pela informação de um jornalzinho que dizia que um maestro estaria iniciando a abertura de uma escola de música”. O começo para meu avô foi difícil, e como ele mesmo cita no diário, o maestro era muito rigoroso com as lições.
A principio o curso do maestro era destinado a 45 meninos, porém nem todos tinham talento suficiente e o maestro realizou outra peneira que reduzia para vinte, o número de alunos. Após o maestro escolher o instrumento que cada um tocaria, meu avô acabou ficando com o trombone: “Devido alguns elogios que o maestro já tinha me feito anteriormente, eu já sabia que iria tocar trombone, o que era a minha verdadeira loucura.”, relatou Tito em seu diário.
Pelo que percebi lendo esses relatos de meu avô, o maestro parecia ser pessoa bem rígida, porém amável e espirituosa. Em alguns trechos fica evidente a postura enérgica do maestro com os alunos. “Fomos então fazer a primeira lição com o instrumento. Um de cada vez. E ali como de costume Jorge, que era muito inteligente, saiu-se bem nas primeira notas da escala, mas nem por isso o maestro deixou de dar-lhe algumas reguadas, porque Jorge esquecia-se e abaixava demais o clarinete. Com força e gestos enérgicos, Paulo Russo erguia o clarinete enfiando a boquilha quase na boca do aluno”, conta no diário Tito.
Todavia segundo meu avô, o maestro era considerado com pai para eles, pois era bondoso com todos os alunos: “Nós considerávamos o maestro com nosso segundo pai, porque ele era bondoso, e sempre guiava os seus alunos não só pra carreira musical, mas também para o caminho de sucesso na vida. Sacrificava-se para que um aluno quisesse trabalhar, arranjando serviços e boas casas aos alunos com dificuldade”, disse meu avô.
Logo depois de realizarem o primeiro concerto com a banda executando o dobrado “Lyra Infantil”, meu avô conta que o maestro queria levar os alunos para tocar em Campinas para tocarem na frente da estatua do músico Carlos Gomes. E lá se apresentaram tocando o dobrado ”Posso Dobre”, que atraiu a atenção dos transeuntes da praça.
Quando a banda estava indo bem e já ao gosto do maestro, o prefeito Emilio Ferreira dispensou a corporação. Esse momento foi bem marcante para Tito e ele relata no diário que o maestro direcionou sua carreira após o termino de suas aulas. “Seu Castro, ouça bem o que vou lhe dizer. Nunca large da música meu filho, você fará mal a si mesmo. Prossiga estudando com essa vontade e dedicação. Não se esqueça daquele dia em que solaste a “Ida” em Americana. Digo com sinceridade gostei demasiado do seu desempenho, pois estava ótimo para um aluno de apenas um ano de estudos”, disse o maestro ao meu avô.
Depois dessa conversa o maestro orientou meu avô e o indicou para tocar na Corporação Musical Municipal Ararense, que era estava sendo formada pelo Maestro Hugo Montagnolli.
A partir disso meu avô seguiu sua carreira de músico profissional montando seu próprio conjunto chamado “Tito e sua Banda”, que muitos bailes realizou em Araras e região na década de 40 e 50. Junto a isso continuou fazendo parte da Corporação Musical Municipal Ararense. O diário em que relatou esses fatos foi escrito em 10 de setembro de 1945,datilografado por ele mesmo.
Tito de Castro, como era chamado, trabalhou também como tesoureiro na Prefeitura Municipal de Araras e faleceu no dia 18 de dezembro de 1963.
Graças a meu avô herdei o dom pela música, que foi fomentado pelas aulas de Franscisco Paulo Russo. Infelizmente não cheguei a conhecer Tito, mas suas palavras ficaram guardadas e perpetuadas pra sempre na história.

*Matéria publicada no Caderno Especial sobre os 20 anos do Teatro Estadual Maestro Francisco Paulo Russo, no Opinião Jornal de Araras, em março de 2011


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