Pular para o conteúdo principal

Gentileza



Segundo o dicionário Michaelis, ou mesmo Aurélio, a palavra gentileza significa qualidade ou carácter de ser gentil, ou ainda, ação nobre, ilustre e distinta. É um dos atributos mais difíceis de encontrar no ser humano moderno. O dicionário ainda cita que gentileza também quer dizer cortesia e elegância. Gentileza é uma qualidade do espírito refinado pela boa educação, principalmente aquela que vem de casa passada pelos nossos pais. Ser gentil vem do movimento interior, o olhar pra dentro de nós para que tenhamos predisposição para o bem, para o ato solidário e a liberdade em formar nosso próprio caráter sem pressões sociais, livres de qualquer tipo de preconceito. Nos dias infernais que vivemos hoje, de pressões de tudo que é lado, parece inconcebível termos a palavra gentileza grudada em nossa HD interna. O “arquivo” gentileza se corrompeu ficando frágil a ação de qualquer tipo de vírus externo. Transformamos nossas vidas em função unicamente do trabalho e da sempre desculpa na ponta da língua: Nunca temos tempo pra nada. Pense em quantos gestos de solidariedade que você deixou de dar por estar com pressa. Hoje mesmo andando pelo centro da cidade atravessei a rua e observei um senhor empurrando seu Fusca velhinho. Sem pensar me dispus a correr e ajudá-lo a empurrar o carro. Gestos pequenos e sinceros como esse nos fazem exercitar nossa gentileza e o espírito de representar o bem deixando-nos em paz. O pensar no próximo nos faz refletir que o mundo não gira em torno de nossas cabeças.

Profeta Gentileza exibindo um de seus paineis

Ao escrever esse post lembrei-me do famoso Profeta Gentileza que foi uma figura lendária e um personagem que marcou época nas ruas de Niterói com seu comportamento excêntrico e profético. Nascido em Cafelândia (para os amantes do café deve a cidade perfeita), José Dautrino teve uma infância ditada por muito trabalho. Dautrino ajudava sua família com o trato dos animais e vendia lenha nas proximidades de sua casa. Desde pequeno o menino apresentava um comportamento bem atípico. Aos doze anos começou a ter premonições sobre seu futuro e sua missão na Terra. Tal comportamento causou preocupações aos seus pais que imaginaram que o filho sofria de algum tipo de demência. Aos vinte anos, José Dautrino constituiu família e prosperou no negócio de transportadora de cargas. Porém um fato curioso mudou totalmente sua vida e sua relação com o mundo. No dia 17 de dezembro de 1961, na cidade de Niterói, houve um grande incêndio que destruiu o “Gran Circus Norte-Americano“, o que foi considerado um dos maiores incêndios circenses da história, matando cerca de 500 pessoas, dentre as vítimas muitas crianças. Seis dias após os acontecimentos, José Dautrino disse ter ouvido “vozes astrais” que o mandavam abandonar de vez o mundo material e se dedicar então ao mundo espiritual. Dautrino pegou um de seus caminhões e rumou para o local onde ocorrera a tragédia, estabelecendo ali sua morada. Com palavras de bondade consolou os familiares das vitimas e  daquele dia em diante passou a se auto denominar “José Agradecido” ou “Profeta Gentileza”. Após quatro anos, isso nos anos 70, o Profeta Gentileza deixou o local e saiu pregando suas palavras de bondade, respeito e amor ao próximo. Nos anos 80, Gentileza escolheu 56 pilastras na cidade do Rio, e inscreveu em verde-amarelo palavras com criticas alusivas ao mal estar da civilização. Uma de suas inscrições dizia: - “Gentileza Gera Gentileza”. No dia 29 de maio de 1996, aos 79 anos, faleceu em sua cidade e está enterrado no Cemitério “Saudades”. Em 2000, a prefeitura do Rio de Janeiro ajudou a restaurar suas obras que foram danificadas por atos de vandalismo e a ação do tempo. O projeto foi denominado Rio com Gentileza e em maio de 2000 concretizou a restauração das obras que se tornaram patrimônio público da cidade do Rio. O professor Leonardo Guelman da Universidade Federal Fluminense lançou em 2000 o livro Brasil: Tempo de Gentileza, que introduz o leitor ao universo desse excêntrico ser humano, explicando sua trajetória. O livro é ricamente ilustrado com seus 56 paineis e fotos do profeta e seus penduricalhos. A cantora e compositora Marisa Monte prestou uma homenagem ao profeta com a música intitulada "Gentileza", que está no disco "Memórias, Crônicas e Declarações de Amor" lançado em 2000.  José Dautrino foi o tipo de personalidade que aos nossos olhos desatentos parecem inexplicáveis quando vivos, e quando morrem é que passamos a entendê-los. Personagens como ele vivem à margem da sociedade e enxergam o que não percebemos mais. Aos que o chamavam de doido, certa vez ele lhes disse: -“Sou maluco para te amar e louco para te salvar“. Assim dizia o profeta.

Confira o clip da música "Gentileza" no Youtube:

http://www.youtube.com/watch?v=VKnVAZHehV0






Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Elliott Smith: O gênio desconhecido do rock

Existem certos artistas que nasceram predestinados a freqüentarem uma pequena esfera musical, cercada de amantes de música muito boa, porém de pouco conhecimento do público em geral. Esse é o caso de Elliott Smith que com suas canções folk melancólicas e autodestrutivas conseguiu atrair um séquito de fãs fiéis, características do bom e velho indie rock. Suas músicas beiram a riqueza melódica a lá Beatles e chegam a desvairados e lisérgicos riffs de guitarra acompanhados de sua voz doce e incisiva. Steven Paul Smith nasceu em 06 de agosto de 1969, mesmo ano do aclamado Abbey Road dos Beatles, disco preferido do compositor. Elliot era apaixonado também pelo cantor Hank Williams e fã de rock mais pesados como AC/DC e Kiss. O cantor Elvis Costello também era uma influência forte em sua música. Elliott começou tocando baixo e montou sua primeira banda chamada Heatmiser. Chegaram a lançar três discos sendo o ultimo, Mic City Sons ,lançado pela major Virgin. Brigas e discussões dissolveram a

Maestro da batuta de ouro

Músico contribuiu para o desenvolvimento do ensino de música em Araras e para formação da Corporação Musical Maestro Francisco Paulo Russo, atuante até os dias de hoje Baluarte e propagador da arte em Araras, o Maestro Franscisco Paulo Russo nasceu em Nápoles, na Itália em 21 de agosto de 1882. Aprendeu música em Nápoles e em Pizo, na Calábria, com o nobre maestro Jacob Percy. Em 1895, aos treze anos, veio pra o Brasil e ainda muito jovem se estabeleceu em Araras. Além de trazer seu conhecimento musical também contribuiu com sua força de trabalho, e começou a trabalhar como barbeiro, abrindo o Salão “Brasil”, localizado na Praça Oito de Abril. Desbravador da música e de personalidade artística multifacetada ministrava aulas de piano, teatro, e dramaturgia. Teve trabalho intenso com teatro em Araras criando o grupo de teatro amador “Grupo Dramático Operário” e a “Sociedade Recreativa de Danças”. Em dois de setembro de 1926, criou o curso de piano em Araras, e foi responsável t

Cicloturismo: Aventura em duas rodas por um dia

Modalidade ganha cada vez mais adeptos que querem fugir do stress do dia a dia  Por Horácio Busolin Júnior Mesmo em meio à cana é possível encontrar  áreas preservadas na região rural de Araras Créditos: Horácio Busolin Júnior “Bom dia, Grupo Café com Pedal, vamos acordar, levantar e pedalar. E para quem chegou agora nem vá dormir. Tome um banho, pegue a bike e vamos passear” – Mensagem enviada por João Luis Mendes, coordenador do Grupo de cicloturistas Café com Pedal de Araras. O sol ainda nem nasceu. São 5h20 da manhã do domingo dia 21 de abril, Dia de Tiradentes e o grupo de cicloturistas de Araras Café com Pedal já se prepara pra mais uma jornada de emoção, aventura e adrenalina. O grupo conta com 100 ciclistas registrados e foi criado por João Luis Mendes, bancário e ciclista inveterado, que se apaixonou pela bicicleta há oito anos. Criado em 2011, o grupo vem ganhado novos adeptos, sejam eles ciclistas amadores ou profissionais. O nome Café com Pedal surgiu po